O pioneiro Ivani Valença fez sua história em Brasília como corretor e empresário de sucesso na capital. Nascido na Bahia, em 1933, teve uma longa trajetória até chegar na capital. Assim, se tornou campeão de vendas dos terrenos da Novacap.
Aos 6 anos de idade, fugindo da seca com a família, Valença mudou-se para o interior de Minas Gerais. Na cidade, o menino fez um acordo com o dono do cinema: venderia balinhas e pirulitos caseiros, em troca, poderia ver os filmes.
No entanto, foi aos 9 anos de idade, que Ivani teve o seu primeiro emprego. Durante a Segunda Guerra Mundial, no governo de Getúlio Vargas, gasolina era uma raridade. Assim, carros e caminhões eram movidos a gasogênio (um enorme equipamento acoplado na traseira dos veículos. Ali eles eram abastecidos com carvão. Era preciso quebrar o carvão em pedaços, e essa era a função de Valença, no qual recebia 90 cruzeiros pelo serviço.
Em 1950, o menino mudou-se para São Paulo com a família. Porém, mais tarde, Ivani decide tentar a vida na capital, sozinho. Sua função: consertar radiadores. Um dia, voltando do trabalho, Valença passa em frente à Mesbla (uma rede de loja de departamentos da época) e se depara com a visão mais impressionante dos seus 19 anos: um avião Cessna inteiro, dentro da loja.
No outro dia, não hesitou, refez o caminho, mas não foi para o trabalho. Ele queria descobrir o segredo do avião. Chegou na Mesbla. Foi apresentado a um encarregado de setor, que fez uma pegadinha e o encaminhou para o Chefe do Departamento de Pessoal da empresa. A secretária, muito gentil, explicou que o chefe não recebia os candidatos, havia um departamento inteiro para selecionar as pessoas. Porém, comovida com todo o empenho de Valença, a secretária falou o horário de almoço do Dr. Ribeiro.
E assim foi feito. No mesmo horário, o chefe saiu para almoçar, e Valença o abordou entusiasmado. Contou para o Diretor de Pessoal que era ferreiro, porém, não havia vaga para a função. Então Valença respondeu “O senhor não tem gente que limpa a loja?”. E, assim, ele conseguiu o emprego de faxineiro aos 19 anos. No entanto, o chefe, impôs uma condição: Valença teria que estudar. Conseguiu.
Depois, Ivani foi tirar seus documentos e descobriu que deveria servir ao exército. Com isso, serviu em um quartel em São Paulo, durante um ano, onde também aprendeu a dirigir. Ao sair do quartel, virou ambulante. Investiu todo o seu dinheiro em um negócio mal feito, e perdeu tudo. Em seguida, conseguiu um emprego de motorista na Argos Industrial, uma fábrica de tecidos em Jundiaí.
Ele trabalhava para um dos diretores, Joaquim Muller Carioba, e atendia especialmente sua esposa, Dona Maria da Penha. Ivani era, sem dúvidas, o motorista mais elegante de São Paulo. Seus ternos eram feitos com os tecidos da fábrica do patrão e cortados pelo Minelli, o mesmo alfaiate de Joaquim Muller. Valença era tão vaidoso que parecia mais com os convidados do que com os colegas de trabalho.
E, em 1955, a história de Ivani começava a trilhar um novo caminho. Mal sabia Ivani que, ao estacionar o carro de Joaquim, seria confundido com um dos convidados. Quando percebeu, ele estava em meio a um dos mais deslumbrantes salões da sociedade paulistana.
Naquela noite, o então Governador de Minas Gerais, Juscelino Kubitschek de Oliveira se apresentara como candidato à Presidente da República.
“Não me esqueço da fisionomia dele, os cabelos colados com brilhantina, esbanjando elegância em um terno em riscas de giz, de lindo tropical inglês”.
No dia seguinte, depois do discurso de JK, Valença fala com Joaquim: O senhor me desculpe, mas se ele fizer Brasília, eu vou atrás desse homem. JK vence as eleições.
Ivani comprava o Diário Popular diariamente para Dona Maria da Penha. Ela se interessava pelos Classificados, onde procurava por ofertas de antiguidades. Em uma das edições, trouxe um anúncio da construtora Pacheco Fernandes: “procura-se jovens motoristas para trabalhar em Brasília”.
O anúncio foi o suficiente para Ivani tomar sua decisão e comunicá-la à Joaquim. O sonho foi adiado por alguns meses. Enquanto isso, aprendeu a vender na empresa atacadista de tecidos Barros e Cia.
Chegada em Brasília
Em 1957, então, Ivani chega ao Planalto Central, em meio aos recém-inaugurados canteiros de obras da nova capital. Contudo, mesmo com a intenção de trabalhar na construtora Pacheco Fernandes, depois de passar pela INIC (Instituto Nacional de Colonização), foi indicado para ser vendedor no setor imobiliário da Novacap.
No início, ele operava a burocracia do Departamento Imobiliário. Porém, por ser muito ativo, acabou chamando a atenção de outro diretor, Íris Memberg. Quando alguém chegava para ver a cidade, Ivani sempre era escolhido para acompanhar.
Quatro meses depois, a Novacap montou um escritório em Anápolis. E, assim, Ivani foi indicado por seu chefe Valter Lima, ao Dr. Ernesto Silva. Com isso, Valença revolucionou as vendas de terrenos na cidade. Tinha gente saindo de Goiânia para comprar terreno da Novacap em Anápolis.
Foi assim que Antônio Balbino de Carvalho, o “baby”, ofereceu uma proposta de trabalho irrecusável, aparentemente. Mas não se tratava apenas do salário. Ivani queria ser corretor de imóveis em Brasília. E, em 1958, Ivani começou a trabalhar como corretor.
No primeiro mês, a comissão de Valença alcançou a marca de 116 mil cruzeiros – 25,7 vezes mais que o salário de escriturário que recebia antes. A Novacap remunerava seus corretores com 5% sobre o valor dos terrenos, que mais caros do que se possa imaginar.
Valença se destacou, mas também chamou a atenção de Israel Pinheiro, que não se conformava com o valor que o corretor estava ganhando. A comissão ultrapassava, e muito, o salário do próprio Israel, por exemplo. No entanto, depois de uma longa discussão, Ivano conseguiu receber o cheque de 475 mil cruzeiros. A maior comissão já paga a um corretor da Novacap.
Mas a discussão com Israel Pinheiro desgastou Ivani. E, com isso, ele se afastou da profissão. Foi assim que, no dia 21 de abril, Valença entregou seu dinheiro a uma outra paixão: os carros. Ele se tornou dono do Posto Atlantic, da SQS 303.
“Foi a maior negócio da minha vida, onde mais ganhei dinheiro”.
Na época, Brasília não tinha opções de lazer. Com isso, o Posto Atlantic (atualmente Bandeira Ipiranga), se tornou o ponto de encontro das pessoas, todos os sábados. Já em 1970, nasce a revenda do Posto Valença, atrás do Hotel Nacional.
Mas, não estamos falando apenas de um posto de gasolina. No Brasil, talvez tenha sido a primeira operação a focar suas atividades na fidelização de clientes através de serviços prestados.
Além disso, os clientes reclamavam que não tinha nada para comer na região do posto. E claro, Valença abriu uma pequena lanchonete. E, inspirado nos ingleses, criou a tradição do chá das 5 na lanchonete, oferecendo chá inglês com brioche.
O negócio deu certo. Porém, uma estranha fiscalização acabou determinando o súbito fim da lanchonete. Valença ficou aborrecido, fechou a lanchonete e aumentou a área de venda dos automóveis. Mas, hoje em dia, ele ainda se arrepende da decisão.
No ano de 1988, o Casa Park, começa a nascer. O terreno onde hoje está localizado o shopping era destinado a uma grande revenda Volkswagen. Mas Ivani se desentendeu com a empresa.
Até que, certo dia, Paulo Guaraciaba, dono do Cine Karin, procurou Valença e perguntou sobre o terreno “tenho um pessoal do RJ interessado em fazer negócio com você, é o Isaac Peres, da Artplan”. Isaac veio do Rio e propôs a construção de um shopping, do qual Ivani seria o sócio através do terreno.
Mas Valença não fez negócio. Ele decidiu ajudá-los, mostrando uma área onde, na época, só havia o estádio Pelezão. Ou seja, Ivani também está por trás da criação do ParkShopping.
A ideia? Valorizar seu terreno vizinho.
Mais tarde, ele descobre uma empresa de Curitiba especializada em montagem de shoppings, que compra a ideia de fazer um projeto voltado para a decoração, para o lar. Assim, o Casa Park se transformou no primeiro shopping do país a se tornar viável em menos de um ano. Hoje, Ivani e seus filhos tocam os negócios.
Curiosidades
- Ivani impressionava a todos com o estilo paulista: terno, chapéu e muita educação.
- Quem tem mais de 45 anos, sem dúvidas, se lembra das mais poderosas estratégias de sedução idealização por Valença: o pirulito distribuído no Posto Valença.
- O Estado de S. Paulo noticiou que, em Brasília, o empresário Ivani Valença instalou um parquinho em seu posto de gasolina. Com isso, uma grande indústria de São Paulo ofereceu um equipamento de parque de diversões infantil. Mas não havia espaço o suficiente. Então, Ivani sugeriu que o representante da empresa procurasse o GDF. Foi assim que nasceu o Parque Ana Lídia (o Parquinho Foguete).
- Em 1972, uma edição especial de uma revista americana, “The Lamp”, com tiragem de 1,5 milhão de exemplares, enviou um repórter ao Brasil para fazer uma matéria sobre os 150 anos de independência. O repórter escolheu 3 personalidades: Pelé, Gilberto Freire e Ivani Valença, prova viva do milagre brasileiro, mostrando que era possível alguém sair do nada para se transformar em um empresário inovador.
Ao inaugurar a segunda etapa do shopping, com oito salas de cinema, Valença se emocionou. Quem estava ali era o menino valente que um dia vendera balinhas para poder ver os filmes. E que, hoje, possui uma história digna de um filme!
Referência:
- Corretores de JK
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